Judiciário levará 30 anos para dar conta da demanda

Por Pablo Cerdeira, publicado no Consultor Jurídico

O grande destaque do Justiça em Números de 2010, divulgado na semana passada, foi, sem qualquer sombra de dúvidas, a redução no número de processos ativos no Brasil. Mas isso não significa que nosso Poder Judiciário tenha encontrado um rumo para a solução do enorme passivo judicial existente. Ao contrário, os dados mostram que, mesmo com todo o esforço, nossa situação ainda está longe de ser considerada boa.

Explico. Em 2010, nas justiças Estadual, Federal e do Trabalho entraram nada menos do que 24,2 milhões de processos. Mas, no mesmo período, apenas 22,2 milhões de sentenças foram produzidas. Isso dá um saldo de entrada de 2 milhões de processos a mais do que o número de sentenças.

Ok, mas o número de processos baixados foi alto, até um pouco maior do que em 2009. Foram 25,3 milhões em 2010 contra 25,1 milhões em 2009. Isso não basta se considerarmos que nosso Judiciário tem cerca de 60 milhões de processos ainda ativos. Além disso, o número mais alto de baixas do que de sentenças indica a existência de processos que já estavam julgados e que apenas aguardavam seu arquivamento.

A tabela abaixo, produzida na FGV Direito Rio, compara os dados de 2009 e de 2010, indicando onde houve melhoras e onde houve pioras no Poder Judiciário.

A primeira observação importante é que o Judiciário está renovando seus magistrados, com o aumento de juízes de primeiro grau, exceto na Justiça do Trabalho. Mas isso não está se refletindo no segundo grau. Ou seja, juízes ou desembargadores de segundo grau estão se aposentando e não está havendo promoções na mesma medida. O destaque positivo fica para a Justiça Federal, que ampliou em 11% sua força de trabalho de primeiro grau. O negativo com a do Trabalho, que está apenas se reduzindo.

Com relação à diminuição de casos novos, esta se concentra basicamente na Justiça Estadual de primeiro grau e nos Juizados Especiais Federais. Merece atenção o fato de que no segundo grau da Justiça Estadual e na do Trabalho o número de casos novos está aumentando, enquanto o número de juízes está diminuindo. Não é preciso ser matemático para se prever onde isso vai dar.

Os casos pendentes, aqueles que já estavam no Judiciário desde anos anteriores, têm como destaque positivo sua redução na Justiça Estadual de primeiro grau em cerca de 7%. Justamente aquela que aumentou seu número de magistrados e que teve redução no número de casos novos. Coerente. No aspecto negativo, aumentou o número de casos pendentes de julgamento no segundo grau tanto da Justiça Estadual quanto da do Trabalho. Também coerente com o parágrafo anterior. Mais processos, menos juízes é igual a mais acúmulo.

Mas curioso é observar o que acontece com a Justiça Federal de primeiro grau e Juizados Especiais. Foi a que teve maior aumento de magistrados (11%), maior redução de casos novos (4% e 13%, primeiro grau e juizados) e a que teve maior aumento no acúmulo de processos no primeiro grau (10%). Algo a se prestar atenção para o próximo ano.

Por fim, o número de processos baixados e de sentenças. A Justiça Estadual foi a única que produziu menos sentenças. Bem menos. Em comparação com 2009, uma redução de 9%. Em contrapartida, o número de processos baixados no segundo grau das Justiças Estaduais e do Trabalho aumentaram.

E aqui mais um ponto importante. Se o número de magistrados de segundo grau dessas justiças diminuiu, se os casos novos e os pendentes aumentaram, o que justificaria esse ganho no número de processos baixados? A única razão que consigo ver é a citada no início deste artigo: processos antigos, já julgados, e que aguardavam apenas o encaminhamento ao arquivo. Isso não é aumento de produtividade e com certeza não se sustentará por muito tempo. Em pouco tempo, processos nessa situação se esgotarão.

Mas o que esses vários números mostram claramente, independentemente das variações anuais, é que o problema é grande. Muito grande. E não será com pequenas mudanças, pontuais reformas, que ele será resolvido. Estamos falando de mais de 60 milhões de processos aguardando julgamento, sem contar STJ e STF, que não respondem a essa pesquisa do CNJ. No atual ritmo, nosso Judiciário levará nada menos do que 30 anos para responder à essa demanda.

Reformas localizadas em nosso modelo, se conseguirem uma redução de 10%, 20%, que seja, no tempo de duração médio dos processos, apenas farão com que, ao invés de 30 anos, o problema seja resolvido em 27, 24 anos. Precisamos de mais do que isso.

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